Na última imagem que de ti vi
galgavas o parapeito da janela do telhado
sítio de cigarros e cumplicidades fraternas,
estavas nu, sabia-te corpo e esbelto e ágil
animal felino natural trapezista em barro inclinado.
Antes do absurdo terminar,
sim, todo este tempo sonhámos um absurdo possível,
absurdo refreado como a paixão negada,
antes de retomarem os ruídos do aspirador
de já intoleráveis vizinhos,
ainda pedi, imperceptível, senta-te no parapeito
sei que o disse e mais pensei
senta-te olha-me sê e o fim
tornou-se mais mudo do que o seu princípio.
Ias cortar um tronco de macieira com bagos de ameixas
escarlates, por nascer, crescido por dentro da casa
no quarto ao lado do quarto que era da saudade
acabada apenas porque já o tinha sido.
Tocámo-nos ao descobrir as minúsculas folhas
perguntando É? Será?
Descemos e voámos nas escadas antes de saltares
para cuidar de um tronco que não saía de uma casa
que o acolhia completo vegetal de verde nascente.
Tinhas mirado os pincéis, godés, tubos usados retorcidos
expostos no caos disperso, agarraste numa das quatro paletas
teimámos e levaste-a contigo tentando arrancar a tinta
que era já a sua superfície.
Lá em baixo, ouvíamos uma amiga e sem querer
querendo-o há tanto, recuei e sem te abraçar
abraçaste-me com a gentil força que desconheço
eternidade de segundos, caminhados depois, sentidos
separados percorrendo as escadas da mansarda
de paleta pintura nas mãos, de seda chinesa cobrindo-te
a pele sedosa pressentida olhada sem ver. Deixaste-a tombar.
E ousei perguntar tenho umas calças brancas de linho
quase o disse envergonhada pela vergonha que não nos existia.
E distanciando-te no corredor do quarto, subindo ao banco
de madeira embutido na parede velha, agarraste-te às telhas
e eu agarrei-me ao corpo de mim que batia acelerado.
Olhava-te sem te ver pedindo-te muda
para neste absurdo seres tu a ver-nos.
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