segunda-feira, 31 de maio de 2004

voos circulares

deixo cair as pálpebras imensas
lentamente olhando-te
para não te ver
não ver o que não consegues revelar
sigo o voo circular
(estamos quase no verão,
aonde é a sombra
da tua casa?
andorinha)
foges do sol, da estrela nocturna
ardida numa quietude desenfreada
esqueces o crescente da lua
hábito espelho de luz
(lá um dia também houve água)
voo atordoado múltiplo
de asas quebradas
és viajante prisioneira de um só lugar
ignoras que na nuvem branca, só ela voga
lá dentro, rolas húmida incerta
julgando-te voar

domingo, 30 de maio de 2004

o que se conhece dos outros?

- gosto tanto de a ver!
- obrigada.
Tinham-se encontrado à porta do prédio. Nunca tinham trocado mais do que meia dúzia de frases. Conheciam-se há mais de 10 anos. Vizinhas. Três andares a separá-las. Uns quantos anos também. Cumprimentavam-se, sorriam-se, falavam sobre o tempo, sobre os animais de estimação ou qualquer outro assunto supérfluo.
- gosto mesmo. está tão diferente. dá gosto vê-la.
- obrigada. realmente emagreci bastante, sinto-me mais…
- nem é isso.
Nem se podiam tratar pelo nome. não o sabiam. Aparentemente só se conheciam pelos traços exteriores.
- não é isso. está mais magra, é verdade. muito mais. mas agora tem um outro ar.
um sorriso era a resposta suficiente.
- está tão diferente, mais leve, com um outro brilho… no olhar… no modo como se arranja… o gosto de… está outra. às vezes custava vê-la… pela tristeza, estava… ainda bem… fico feliz.
Por resposta, um sorriso, emoção quase incrédula, a interrogação muda: - era assim tão visível?
O elevador tinha parado. Saiu e segurando a porta do elevador, olhando-se nos olhos, ternamente:
- desejo-lhe toda a felicidade, como a desejo para a minha filha.
- obrigada. até logo
- até logo.
O elevador continuou a subir mais três andares. Um nó de comoção prendeu-àquela senhora, quase desconhecida. um laço de ternura subitamente visível. Por aquilo que tinha ouvido, sentido. Pelo que tinha sido, pelo que era agora… sim, brilho de vida, renascida. pelo olhar que jurara um dia nunca mais ter de abandonar… um olhar para os outros, para muitos outros… Nunca mais…
Quando se olha, algures recebe-se, despertam-se olhares novos… conhece-se. Onde é que tinha ouvido: olhar é amar?...
Tira a chave de casa da mala, coloca-a na fechadura, roda-a. Entra em casa. Vazia. Fecha a porta. apenas aquela de madeira, pesada.

sexta-feira, 28 de maio de 2004

encontros...

sorrio hoje ao entrar na blogosfera. E que bom é sorrir mesmo que o motivo seja aparentemente banal, ou inócuo... ou talvez não... de modo que não resisto, mesmo atrasada para sair, almoçando tardiamente e simultaneamente escrevendo agora e aqui, rapidinho.
todos nós somos veículo de encontro entre pessoas, e neste mundo virtual, meios que possibilitam partilhas, leituras, aproximações, mesmo que efémeras, sobretudo éfémeras, mas que creio que de algum modo ficam, quanto mais não seja num subconsciente afectivo que nos vai estruturando, construindo...
já jovem... (e não é que de certo modo já não o seja)... sorria quando dois amigos meus se conheciam e havia alguma partilha, algum encontro entre eles, por eles próprios, pelos interesses, pelo estar que ambos mantinham na vida... é raro isso acontecer, mas acontece... e eu sorria, especialmente não fazendo nada, até porque o forçar é do pior que há - e quem tem irmãos sabe isso muito bem: a velha máxima dos pais em querer que os irmãos sejam amigos à força -. Talvez este meu sorriso seja algo de infantil, ou fruto de um qualquer utopismo... mas com tantos desencontros, mal-entendidos, pequenas guerrilhas que proliferam, não é bom ver, aqui ou em outro qualquer lugar, encontros, comunhões de qualquer tipo? especialmente entre pessoas sensíveis e interessantes...?

quinta-feira, 27 de maio de 2004

criador e criaturas §3

"Que é desenhar?" "É a acção de abrir um caminho através de uma parede de ferro invisível que parece erguer-se entre o que sentimos e o que podemos. Como se deve atravessar essa parede, já que de nada serve bater-lhe com força? Temos de miná-la e atravessá-la com a lima, lentamente, com toda a paciência segundo me parece."

"sim, fiz isto em duas horas, mas trabalhei anos para poder fazê-lo em duas horas"


"espero sempre não trabalhar apenas para mim; creio na necessidade absoluta de uma nova arte da cor, do desenho e da vida artística"

"a pintura promete tornar-se mais subtil, mais musical e menos escultura, promete enfim a cor?"


"Censurar-me-ia se não tentasse fazer quadros de tal modo que eles levassem a reflectir seriamente os que seriamente reflectem sobre a arte e a vida? Queria pintar de tal modo que todas as pessoas que têm olhos compreendessem?"


O meu grande desejo é aprender a fazer tais inexactidões, tais anomalias, tais transposições, tais modificações da realidade que saiam mentiras, sim, se quiserem, mas mais verdadeiras que a verdade literal"


"eu adoro o real, o possível.
Em lugar de procurar exactamente o que tenho diante dos olhos, sirvo-me da cor do modo mais arbitrário para exprimir-me fortemente"



cit por Mário Dionísio in O Drama de Vicent Van Gogh. 1953. Coimbra: separata da revista Vértice, pp. 19, 22, 23, 27, 28, 30

quarta-feira, 26 de maio de 2004

0 mundo corre lá fora…

Parece que o mundo está a andar mais depressa do que eu… o mundo e o tempo… fez ontem 5 meses que entrei neste ‘mundinho’ blogosférico. Passa tudo tão a correr, e se paramos para saborear um pouco mais, se nos alheamos concentrados nalguma coisa que nos desperta a atenção, dá-nos por vezes a sensação de que ao voltar a olhar para fora, ‘pela janela’ já se passaram imensos acontecimentos… mas no fundo, “tudo vai continuar como dantes”… o mesmo com outras formas. A renovação, as pequenas revoluções interiores dão-se quase invisivelmente; há um acumular progressivo, quase imperceptível no sentir diário, até a um momento, por vezes mesmo retrospectivamente indeterminado, que reparamos que estão lá, surgindo-nos como se, sempre estivessem lá estado, sem a consciência de um outro passado havido, vivido. como se não pudesse ser de outro modo, embora pudesse na tão variada hipótese de existência. escolhas, opções, quase ínfimas que vão determinando o decorrer do estar, um simples olhar para um lado ao invés de todos os outros.
O mundo corre lá fora… até há uns dias, por mil e umas ocupações, agora com uma recuperação lenta, mas no bom caminho… nem me apercebi da abertura da feira do livro, quase deixava passar a minha tão apreciada e ritualizada visita nos primeiros dias – exemplo pequenino de uma desatenção mesmo a nível pessoal, egocêntrico; para não falar nas ‘desgraças’ e ‘anedotas tristes’ que assolam este mundo, há uma certa recusa de ver, um cansaço de olhar, de o pensar. há prioridades que se vão construindo, assumindo, mas que sejam conscientes, conscientes de que a qualquer momento se pode sempre olhar para outro lado, para um qualquer outro lado do mundo, do nosso, do de nós todos.

terça-feira, 25 de maio de 2004

espuma vaga

ofereço-me à chuva
numa limpidez que sustenta
o que a bruma
dissolve,
parto viagem -
re_volta
volta_rei
rei_nado
de mim? -
quantas águas inebriaras
náu_searas
de mar_és
tudo o que sonho
nem chuva
ou bruma

vaga
espuma

domingo, 23 de maio de 2004

Terceira manhã consecutiva a acordar suada, cheia de febre, garganta inchadíssima, quase não consigo falar, comer ou beber. Ontem ainda tentei escrever isto: sinto-me numa outra dimensão. uma dimensão do sono e da irrealidade, de um estado quase pré ou pós comatoso. a febre baixou um pouco e apesar deste sono irresistível me continuar a atacar – estar quase 24 horas a dormir, a dormitar ou com uma vontade enorme de dormir, não é de modo algum normal, mesmo com 39º de temperatura, mesmo com esta garganta cheia de pontos brancos. agora 5 minutos de tentativa de normalidade. nem ler consigo, nem comer, beber, só aos golinhos. que miséria!
E com hoje são mais 24 horas. ou seja há mais 48 horas que não faço outra coisa que não seja dormir, dormitar, ter arrepios de frio, ter suores de todas as temperaturas. num estado de semi-irrealidade, de deambular, de alguma falta de equilíbrio ao andar. E tanta coisa para fazer…
Estarei a fazer concorrência ao 'doi-me'?! Não, a césar o que é de césar... a mim, só umas anginas daquelas!!!
E como tal, posts mais 'criativos' vão ter de esperar...

sexta-feira, 21 de maio de 2004

cheiro da terra molhada de maio




terra fértil. terra sofrida de inverno. lago de lágrimas. solo sentido. terra castanha e só. não é verde. o verde não é dela. o verde vem do seu ventre, das suas mãos, dos torrões que a unem a si mesma para não se perder. nunca será verde, nem azul. é vermelha do suor dos mortos que a amassaram. amarela tostada do sangue desidratado. deserto baço, viveiro de escorpiões auto-fágicos. barro, telha ou tijolo, formas uterinas inventadas.
terra
tara
perfume na brisa passada

quarta-feira, 19 de maio de 2004

farsa de cronos

qual baile de carnaval
em veneza
cronos mascara-se de eterno
transveste-se de efémero
em jogos alternados
ilusionistas
rindo de todos
nós, desgraçados

nunca te terei, lugar encantado
alheio ao percurso diário
inferno desejo de paraíso
longe, veneza, minha amada…

terça-feira, 18 de maio de 2004

percalços...

Será que é hoje que o meu computador fica em condições? quando não tinha anti-virus e tinha vírus, funcionava... agora com anti-vírus instalado, desregulou... e eu já estou com o síndroma do 'isolamento'... da 'incomunicação'... espero que amanhã esteja tudo bem, configuradinho de novo, tudo certinho!!
Já não bastava o cansaço do trabalho... ainda isto, há que dias... preciso do som do silêncio do campo... do mar! só queria estar a quilómetros de automóveis, gente ruidosa... mas ligada ao mundo...

domingo, 16 de maio de 2004

"desculpa"

as palavras por vezes são demasiado preciosas para as usarmos tanto…. ou são inúteis, quase vazias - esvaziadoras das razões mais profundas…

… é muito?

não quero ensinar nada a ninguém (também ninguém ensina nada a ninguém, só se vai aprendendo). não quero que ninguém ‘mude’ por mim, não quero mudar ninguém (também ninguém muda por ninguém, só se muda quando se sente necessidade interior). Já quis, não o sabendo, a coberto de uma aceitação que julgava que tinha relativamente a outro. e descobri, mais tarde, demasiado tarde talvez, que afinal só não me aceitava a mim própria. não pretendo interferir nas relações que os outros mantém com terceiros, com a vida. estou se calhar excessivamente cansada para isso. ou apenas seja simplesmente uma opção interiorizada. talvez só queira paz. solidão? será mesmo paz sinónimo de solidão?
não quero ter de fazer juízos de valor sobre ninguém. mas quando é preciso responder, quando há perguntas, exigem-se respostas coerentes, mais ou menos ‘objectivas’ que podem implicar opiniões, sensibilidades… e explicar… nem é explicitar apenas, é explicar – detesto explicações, gosto de explicitações - . e em que é que diferem? é talvez um pôr em causa, é uma acção rejeitar de algo para adoptar outra.
por vezes o ter de dizer, o dizer, é já interferência, não é diálogo. ou talvez se resuma a uma incapacidade minha para dizer ‘não’ ou ‘não gostei de’ (porque será que sinto que isso põe em causa o outro? ou é medo de magoar os outros? especialmente daqueles que gosto). talvez preferisse não ter de dizer porque não haveria necessidade de palavras. (talvez tenha ficado cansada de um certo excesso de palavras, depois de uma carência primordial – depois da fome, uma sobrealimentação gordurosa). e quando há essa necessidade sinto uma falta de liberdade, um constrangimento; não porque não se deva falar, mas porque não ‘deveriam’ existir as coisas que dão origem ao ‘ter de’… são demasiados ‘must’… e só a sensação de ter de, aparentemente, assumir um papel que detestei em tempos em alguém, papel esse que me minimizou, destruiu… um papel que não é meu, que não sou eu… não quero. fá-lo-ei por mim, se for necessário. não pelos outros. não é essa a relação que quero ter. quero ser tocada, amada, não só pela ternura do espírito, mas em todos os centímetros quadrados da minha pele, quero amar todos os poros de alguém que respire livre. Há por vezes um cansaço em mim, sim… mas só quero ser, ainda quero ser… é muito?

os açores de 'antero'

Viagem à "ilha do fogo azul" pelas mãos da poesia de saudades.

sábado, 15 de maio de 2004

nocturno de areia

quase toco a noite macia, tímida e quente. pelos dedos entreabertos, enleiam-se beijos de estrelas cadentes, traçando riscos dourados no dia que amanhecerá. na palma da mão, acolhe-se o segredo, linhas ondulantes de vida, ilhas de dádivas e tesouros, círculo imperfeito de ternura. com as mãos, um espectro de gesto por cumprir, desenho quimera, corpo contorno fantasma. murmúrio da vontade de voar, ecos elípticos que evolam os medos dos naufrágios. na pele, areia líquida dócil, espelha-se o nocturno luminoso dos mares.
Fotografia de Ansel Adams

quarta-feira, 12 de maio de 2004

sob o véu

sob o véu, 2000
LDS
acrílico sobre tela,
40 x 30 cm

terça-feira, 11 de maio de 2004

no sorriso
ausência

nos olhos tristes
fio de lágrimas

em mares ávidos
lua


dói-me a tua dor...

segunda-feira, 10 de maio de 2004

No espanto… desvanecido.

Lembro do dia das orquídeas
chegaram suave lilás, inesperadas
espantadas como eu.
olhámo-nos perguntando
és tu a beleza flor?
e acreditámos.
hoje não sei se era verdade,
ou ilusão o que senti e
vi, suas pétalas crescerem
e folhas que não são delas
folhas e pétalas de cravos rosas
e túlipas cores do sol solidão
perfumes de fogo inebriantes
orquídeas alvas de música
orquídeas que podiam ser mundo.
E em cada dia corria, acercava-me delas
e sorria.
hoje ao entrar a soleira da porta,
hesitei. Recuo - definharam no tempo - eu sei –
lenta, percorro os passos de ontem
ainda esperando o espanto,
receando o desencanto,
serão cactos empedernidos
cardos com espinhos
ou apenas, a minha angústia vazia?
só uma orquídea
quase desvanecida…

domingo, 9 de maio de 2004

Lampedusa & Visconti

"O negro do fraque, o cor de rosa do vestido, misturados, formavam uma jóia estranha. Ofereciam o espectáculo mais patético que pode existir: o espectáculo de dois jovens apaixonados que dançam um com o outro, cegos aos defeitos recíprocos, surdos aos avisos do destino, convencidos de que o caminho da sua vida será tão liso como o chão daquela sala, actores ignaros a quem um encenador faz desempenhar um papel de Julieta e Romeu sem lhes mostrar a cripta e o veneno previstos no argumento."
"Don Fabrizio sentiu o coração amolecer: o seu enfado cedia lugar à compaixão por aqueles seres efémeros, que tentavam desfrutar do exíguo raio de luz que lhes era concedido entre as trevas que antecedem o berço e as que se seguem ao último estretor. Poder-se-ia ser severo com quem está destinado a morrer? Seria ser tão vil como as peixeiras que há setenta anos insultavam os condenados na Praça do Mercado.(...) um dia, os toques da sineta que ele ouvira três horas antes nas traseiras de S. Domenico chegaria aos ouvidos de todos eles. Não era permitido odiar nada a não ser a eternidade."
"Além disso, toda aquela gente (...), todos aqueles imbecis, aqueles sexos fanfarrões, eram sangue do seu sangue, eram ele próprio".

O Leopardo (Il Gattopardo, 1963, ITA/FRA) de Luchino Visconti
baseado no romance homónimo de G. Tomasi di Lampedusa, Editorial Presença (1995)

sexta-feira, 7 de maio de 2004

corpo sem sombras



Como se o mundo começasse pela última ou acabasse pela primeira vez, à sombra da oliveira. sob a oliveira, aconteceu o primeiro beijo único, ainda mal nos tínhamos olhado e já nos beijávamos pela última primordial vez. vínhamos com o brilho no olhar, vi-o depois, ou antes, não sei. vínhamos de pulsar contido, de tanto que doía a conter. de voz embargada, tal eram as mil vozes que queríamos ser. no silêncio dessas vozes mil, mal nos olhámos no tempo. o tempo tinha terminado lá atrás, por detrás da oliveira com sombra. sob a sua sombra éramos apenas um olhar eterno de tão fugaz. um beijo efémero de tão longo, de tão desejo. um beijo de tanto. um beijo de tudo. um beijo de nós. um beijo sob a sombra da oliveira. abraçando-nos a nós. e a sombra que era a oliveira a abraçar-nos. nós abraçados pela oliveira sombra. nos teus braços senti o teu tronco como a sombra sentiu o tronco da oliveira. o teu corpo existindo no meu. o meu corpo sendo no teu. sombras de corpo no outro corpo. o corpo da sombra abraçando o corpo da oliveira. corpos de corpos sem sombra. o teu corpo no meu. o meu dentro do teu corpo. um só corpo sem sombras.

quarta-feira, 5 de maio de 2004

Bem vindos

a este novo Lugar Efémero
Novo... mas na continuidade... como, em tudo, uma sucessão de Lugares... de Tempos... de Acções... sempre Efémeros...

Mudança de Lugar...

O novo Lugar Efémero está em

lugarefemero.weblog.com.pt

Em breve estarão também naquele lugar os posts que escrevi aqui ao longo de mais de 4 meses, mas irão também permanecer aqui… até que o vento os leve…

A partir de agora, todos os posts serão escritos no NOVO lugar.

Apenas dois apontamentos de despedida efémera:

Gostei muito de estar aqui. Desde a última noite de Natal quando o criei e sentida por mim de um modo peculiar, complicada… até hoje, os momentos passados aqui foram especiais… todos e cada um… com um envolvimento inesperado, num desafio que não é mais do que um crescimento pessoal a alguns níveis, estabelecendo por vezes uma maior comunicação e interioridade do que na dita vida real… é um outro estar… momentos de simultânea partilha e solidão, de superação e de refúgio, de leveza e de peso, de (re)encontros múltiplos.

E claro, não podia deixar de agradecer a todos VÓS que por aqui passaram e, que em silêncio ou de outra forma qualquer, fizeram com que este Lugar fosse feito CONVOSCO.

Obrigada.

Encontramo-nos aqui mesmo ao lado…
ou talvez num outro qualquer Lugar Efémero

Nota: Só para relembrar a quem tem um link para este blog, e se assim o continuar a entender, deve mudar o mesmo: o nome é igual, só as extensões mudam.

terça-feira, 4 de maio de 2004

não fosse o cansaço
ou engano claro, o hermetismo,
e saltaria do barco
ao cruzar a foz
antes do mar ser
largo e gravítico.
esqueceria o meu olhar no céu
água, ainda gasosa água,
fantasia
ser tudo, céu e mar
ser rio de onde partia
ser porto amarra, ou liberdade
acostada
o próprio navio

sábado, 1 de maio de 2004



digo apenas, preciso de ti, preciso como nunca me ousei dizer. entrei num labirinto, como todos sem saída visível. nas paredes em que toco, onde cravo as minhas unhas, julgando serem carne minha ou de outrém, pouco importa, afinal só eu me rasgo sem fim. por corredores percorro o desespero, dor incerta. em fuga tentada, cubro-me em chão sem cave ou alçapão, num fundo liso magoado. não me deixes desistir. não me abandones agora. figura-te em corpo, espelho perceptível de um decifrar. procura cruel por entre o ser estranho das palavras. inacabadas. ouço quase um surdo bater de asas como o crepitar do incêndio. serão cinzas esvoaçantes, sons de pássaro de fogo, ou a vazia angústia da loucura? não me deixes sepultada entre estas barreiras mortas. escrevo errante por estas ruas concêntricas, exaurindo-me num gesto último. fio de seda em oculto segredo. não chegues tarde. tarde demais. preciso de ti.

criador e criaturas §2



"Começo por organizar o meu quadro, depois então qualifico os objectos. Trata-se de criar objectos novos que não podem comparar-se a um objecto de realidade; é precisamente isso que distingue o cubismo sintético do cubismo analítico".

Juan Gris
cit por Roger Garaudy, Um realismo sem fronteiras,
Lisboa: Pub. Dom Quixote, 1966