domingo, 12 de novembro de 2006

faz-de-conta

regresso à infância. à minha infância. brincando. brincando de faz-de-conta. faz-de-conta que brincamos. faz-de-conta que construímos uma casa. uma grande casa. com coisas bonitas lá dentro. à volta uma vedação. que não é fechada nem aberta. em torno de um tapete verde e cinzento. talvez mais cinzento do que verde. manchado. fazemos de conta que é preciso um lago. vamos construir um lago. um lago não de água. de terra. com paus que em vez de peixes, parecem tubos de aspiração. faz-de-conta que brinco. que estou ali a brincar. e de repente o jogo é outro. vamos brincar às escondidas. estou cá. já não estou. já estou mais uma vez. e não estás. eu estou atrás de uma árvore. tu? tu, não sei. se soubesse não era às escondidas. também podíamos brincar à apanhada. mas era preciso correr. e eu já não corro. só aos bocadinhos. o fôlego já não é o que era. maldito tabaco! não sei de ti. a sério! afinal o jardim era grande. como na sensação de criança. e em vez de um lago, fizemos vários. pequeninos. aqui. ali. fizemos? às tantas fui eu que os fiz. fiquei sozinha a brincar. faço de conta que estou a brincar. mexendo em legos. parece que brinco sozinha. todas as crianças, no fundo, brincam sozinhas. todas as crianças brincam a sério o faz-de-conta. começo a construir um castelo. brincando de princesa? desconstruo. –o. reconstruo. –o. concluo: não tenho peças. só um palco onde represento. onde jogo com duas bolas vermelhas. duas? não, uma para mim. a outra ficou quieta à tua espera. à espera que viesses brincar. já não são bolas, faz-de-conta que são maçãs. vermelhas. eu como a minha. a outra… a outra fica no cesto. e faz-de-conta que se faz tarde. o jogo a brincar acabou. vamos agora brincar a sério. como os jogos que começam a brincar e, a certa altura, sente-se que é afinal é a sério. com beicinho, com lágrimas e tudo. tudo silencioso. rodeio o nosso castelo. meio edificado, meio por acabar. no regresso a casa, a música do faz-de-conta que é música. ponho-a alta, tão alta que faz-de-conta que os baixos são distorcidos baixos superprofondos. alta para fazer de conta que não se ouve o que é a sério.

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