domingo, 31 de dezembro de 2006

último dia

seria tempo para balanços se fosse pessoa de balanços. o meu balancear ou o meu balanceamento dá-se, se ou quando se dá, no durante, nunca num qualquer depois. não há peso(s). há marcas. marcos. que não delimitam, somente assinalam. mas não há o acto de pesar: o mais, o menos. houve, ponto final. houve o que a memória preserva, dinamicamente. a memória cognitiva, a memória emocional, as memórias...
assim como o que se vê, tende a ser semelhante a nós mesmos, e assim julgamos/vimos os outros - não é, como se costuma dizer, (só) nas costas dos outros que vimos as nossas, é naquilo que se ouve que se vê quem o diz -, julgamos/vimos a nós mesmos, as nossas próprias memórias, a sua (in/)substancialidade também é (parte) do que somos.
2006... foi. como o 2005. como o 200...
fica, vai ficando o que se sente como 'bom', o que ainda faz sentido no presente. porque se não fizer um qualquer sentido, desaparece, ignoramos a sua existência. só existe o que importa, para nós, para aqueles que nos são importantes, mesmo que estes sejam 'desconhecidos'.
é também época de desejos. como se os nossos desejos, o simples acto de desejar pudesse influir no fluir das coisas! já desejámos tantas coisas, tantas pequenas coisas... e alguma vez as fizémos acontecer?! só mesmo aquelas que dependiam exclusivamente de nós. e isso não é desejar, é fazê-las ou tentar fazê-las acontecer.
ainda assim, utopicamente, paradoxalmente, desejo que se tiverem desejos, eles vos aconteçam, se concretizem. todos, alguns, os que puderem ser...
o meu '(não-)desejo', para mim, é simples (é?): nada esperar, saber receber tudo o que vier.

sábado, 30 de dezembro de 2006

queria uma avó velhinha
uma mãe ou uma tia
uma irmã mais velha ou mais nova
queria um colo de mulher
onde me contasse uma história
bem velhinha
uma história como a dela
como a minha




queria uma antiga cozinha
de portas largas e num canto
a lareira, cheia de vozes e
cheiros, com lágrimas ou risos
nos silêncios de irmãs
na escuridão branca

a nuvem musgo

de gotas de letícia

privilégio

enquanto o sol entrar assim janela adentro, e o rio, ora brilhante, ora cinzento, azul, verde, branco... os rios, o de cá e o da outra margem, e a serra da arrábida lá longe, por vezes contorno, outras apenas sopé ou cume, rodeada de neblinas... enquanto o sol ou a lua, e a nuvem baixa roçando o meu braço esticado, e a chuva e a trovoada rebentando pelo adivinhado além-tejo... tudo isto, dentro dos meus mornos lençóis matinais... ahhhh... como é bom estar aqui.

imagem retirada de um catálogo
o sol e a lua, 1956
José de Santa-Bárbara
óleo s/ cartão

sexta-feira, 29 de dezembro de 2006

bendita des-memória

à hora de almoço penso, onde é que passei a última passagem de ano. durante a tarde, de vez em quando pensava nisso... e a pergunta mantinha-se. ao fim do dia, a interrogação continuava. tento telefonar à minha irmã, ela sabe responder concerteza. não atende. na viagem de comboio vou lembrando... do meu sobrinho mais novo contente, rindo, rindo, batendo palmas, com o seu brinquedo giratório cheio de luzes... e nós batendo palmas e rindo com ele.
da última passagem de ano ficou o riso, aquele riso.

e deste natal... o teu olhar pelas palavras, a minha emoção, o nosso abraço. a tua pergunta. é sim, de felicidade. foi, sim, de me/nos tocarmos.

quinta-feira, 28 de dezembro de 2006

a princípio uma, duas, uma dezena, uma linha
interrompida pairava escorregadia pelas águas.
gaivotas julguei eu que na noite tinha gritado
ou sonhado, deixem-me ir convosco,
mas elas estavam ali atracadas no silêncio do cais.
as outras, apenas aves, das que vão e
vêm quando é tempo de ir e vir.
e vinham para logo irem, muitas, quais fiapos jorrando
cada vez mais e mais, voando com o olhar
já na foz, tal como aquela correnteza imperceptível
da água. já não era um bando, era um pano
de aves escuras em contraluz, deslizando
entre dois panos cerúleos,
juntando-se lá longe como uma só
asa dançando evocante.
e em revolto véu romperam o horizonte.
no cais em silêncio, eu e as gaivotas.

segunda-feira, 25 de dezembro de 2006

Natal à beira-rio

É o braço do abeto a bater na vidraça?
E o ponteiro pequeno a caminho da meta!
Cala-te, vento velho! É o Natal que passa,
A trazer-me da água a infância ressurrecta.
Da casa onde nasci via-se perto o rio.
Tão novos os meus Pais, tão novos no passado!
E o Menino nascia a bordo de um navio
Que ficava, no cais, à noite iluminado...
Ó noite de Natal, que travo a maresia!
Depois fui não sei quem que se perdeu na terra.
E quanto mais na terra a terra me envolvia
E quanto mais na terra fazia o norte de quem erra.
Vem tu, Poesia, vem, agora conduzir-me
À beira desse cais onde Jesus nascia...
Serei dos que afinal, errando em terra firme,
Precisam de Jesus, de Mar, ou de Poesia?

David Mourão-Ferreira

Lugar(es) Efémero(s)

Foi numa noite de Natal, há três anos que nasceu o meu primeiro blog.
Primeiro no blogspot, depois no weblog.
Em Setembro foi a despedida e, passado dois dias, abri este outro lugar.
Porque escrever é-me necessário. Seja em que lugar for, aqui, ali, num qualquer pedaço de papel.
Foi naquele Lugar Efémero que o descobri... depois de uma noite de natal, com mais natal do que eu julguei naquele momento.

Hoje é dia de Natal... um dia para 'nascer'.

Três anos ...

após o meu primeiro post, regresso a este Lugar...

Efémero?

O que há de mais importante - perene - senão o que toca e permanece no coração?


Mais de três meses de ausência, aqui, desvelo - alguns já o saberão - o meu outro lugar.

Por razões diferentes - e como o tempo as faz acontecer - quis ir para um lugar onde se escutasse


(N)O Silêncio do Deserto.


Obrigada aos que ainda continuaram a passar por aqui.



[post escrito em lugarefemero.weblog.com.pt]

domingo, 24 de dezembro de 2006

presentes...

já tenho uns no sopé da árvore, de natal, por abrir. recebo-os e guardo-os. mesmo fechados, no coração. abri-los-ei numa hora especial. pequenos só em tamanho. “miminhos” como chamei àqueles que troquei. fico sempre espantada quando recebo. fiquei ainda mais por todas, no meu local de trabalho, se terem lembrado. o natal não é mesmo num só dia. quando se dá afectuosamente um sorriso, uma palavra de atenção, recebe-se em dobro... no afecto. porque o receber é também uma oferenda...

e há dádivas que nos deixam sem palavras. porque vão directas… tocam num qualquer âmago nosso.

os meus velhos pais natais dizem-me arranja tu a prenda, nós já não podemos caminhar. a deles que se compra, esperará talvez, não sei se terei tempo, também já esperou quase um mês. o gesto deles já é nosso, como sempre, para sempre. esse é uma oferenda. o outro é ‘só’ uma ‘coisa’ – cara, mas não deixa de o ser. prefiro as coisas que não são coisas. símbolos das outras. e ainda falta uma que vou dar. que também me vou dar... iremos receber.

como em criança, não o sendo, já – ainda - sinto um pouco a ânsia da véspera. do adormecer inquieto. dos pés frios. mais logo é natal...

sábado, 23 de dezembro de 2006

A todos os que por aqui passam, o desejo de umas

Boas Festas

do Lat. festas.
f., dia santificado, de descanso, de regozijo;
comemoração, solenidade religiosa ou civil;
festejo, função; romaria; festividade;
fam., grande alegria;
(no pl. ) carícias, afagos.

boas -s: cumprimentos, felicitações por ocasião do Natal e Páscoa; presente que se dá no fim do ano;


de todos estes prefiro o plural... o múltiplo... porque é sempre tempo para um afago, para uma carícia.
mais que desejar, fazê-lo.
mesmo que julgemos que não é importante para o outro, mesmo que o outro não repare...

infâncias...

sábado de manhã. véspera da véspera. de natal. como num dia de natal, o céu azul e frio. não tanto frio como o de dias passados. afinal, a casa, estar em nossa casa, é o nosso centro-lugar, quente. finalmente é hora de fazer a árvore de natal. o silêncio da manhã é quebrado, não por canções habituais de natal – também não sei quais seriam, nem onde as encontraria -, nem por outra música alusiva. no leitor de cd’s, coloco à vez, dois presentes – não sei se de natal, mas certamente de estima, de amizade – com as ‘marchas, danças e canções’ de lopes-graça. um deles, edição do avante, com gravações no coliseu dos recreios em 25 de Maio de 1974, o outro edição da antena dois – as canções, da minha infância, como é o natal. pensei, amanhã à noite, vou levá-los para recordarmos, para os mais miúdos ouvirem – o crédito de ser a tia por vezes é mais ‘persuasivo’ - .
Monto a árvore, os enfeites – todos de outros anos, alguns de muitos, muitos anos – dispostos numa desordem segundo a inspiração e o olhar que se vai construindo – nunca sai muito diferente do habitual, fica – é - sempre diferente em cada ano -. testo as luzes, à noite quando escurecer, acendê-las-ei. no fim, a estrela – tenho à escolha duas estrelas, uma de compra, outra que eu mesma fiz há anos atrás. olho, não há que duvidar, é esta que coloco no pináculo. dou três passos atrás, observo a árvore, e sorrio.
e venho aqui contar, e agora ala… ainda há bastantes coisas para fazer até amanhã.

que espantoso, tinha acabado de escrever, toca o telemóvel. é uma amiga de infância. há mais de 20 anos que não nos falávamos, que não nos víamos. a última vez já tinha sido um encontro de adolescência. fiquei feliz. combinámos encontrar-nos. um destes dias

máscaras de natal

se houvesse máscaras de natal – há-as? – seriam aquelas que ao invés de impedir que se veja de fora para dentro, obstam que se olhe de dentro para fora, vendando os olhos/o coração de quem vê, e não (apenas?) o rosto de quem é visto

sexta-feira, 22 de dezembro de 2006

perdi-me no teu olhar

alumiei a lua

crio-nos em inaudito solar
perto da madrugada
as aves rasantes
beijam as águas francas
dum tejo
onde se abrigam nuas

domingo, 17 de dezembro de 2006

partir sem partida
sem cais
ou gestos de adeus

uma fragata
em nenhum rio
ou margens apostas

por horizonte
rústicos céus
silvestres águas
esquecer tudo o que se pensou. o que se sentiu. o que se pensou que se pensou. o que se pensou que se sentiu. o que se julgou sentir. nem é esquecer. é varrer com uma vassoura de bruxa, ou fada, tanto faz. nem é varrer. porque ainda ficaria o lixo, os restos, os dejectos. não é acção. de expurgo, de abandono, de limpeza. simplesmente é. como um acontecimento. vindo de súbito. assim sem o querer, sem o pensar, sem o sentir.
vidas de tantos convencimentos, de certezas, de ilusões, de enganos. e como se acredita neles! mesmo convencidos do seu contrário, acredita-se. amarras, sempre amarras que tolhem. mesmo as que se cortam. as que se pensa que já se extirparam. mesmo as que se soltam.
o difícil não é o novo.
é o outro.

sábado, 16 de dezembro de 2006

graças...

Agradecer pelo que não temos…
Sem contar, vou desfiando… menos uma, duas… oitenta e oito bagas de amoras… como contas de um rosário que desconheço. novenas em nome de um outro nome.
Agradecer pelo que temos…

sexta-feira, 15 de dezembro de 2006


julgo ouvir um som. quase como o início de uma música. quieta nem me lembro de desejar dançar. o quase som estende-se até ser quase audível. prende-me a atenção. e quando o ouço, o distingo entre os sons do mundo, extingue-se. assim veio e foi. não dançarei outro som. não o deste silêncio

quinta-feira, 14 de dezembro de 2006

contrariando a geometria euclidiana

os pontos de duas rectas paralelas, não coincidentes, tocam-se para cá... e para além do infinito.

é o prodígio da geometria hiperbólica, já que não existe 'hipo-bólica'.

terça-feira, 12 de dezembro de 2006

do espírito natalício #4

Este ano ainda não vi o Natal. Não me reconheço neste Natal, das luzes foleiras, das árvores artificiais decoradas artificialmente, dos sorrisos forçados, das mentiras pró-conciliatórias.
Contudo, sei que o Natal está em mim. O meu Natal de criança. Fazíamos com a mãe, a árvore de Natal, com um pinheiro que íamos buscar à rua da frente, depois a areia e as bolas e as fitas... uma vez, fiz uma estrela para o topo da árvore. No fim, uns fios prateados para cobrir a areia, um papel de natal para esconder o balde. E o presépio, que foi crescendo, crescendo com múltiplas figurinhas. Eram todas importantes até o cordeirinho e a casa da montanha. O musgo que íamos apanhar, num domingo de manhã, ao olival. Agora, o presépio está em casa de minha irmã para os meus sobrinhos.
Na véspera, as filhoses começavam a ser feitas, havia força e tempo, força para as amassar, paciência para que levedassem durante horas, dentro de um cobertor, e depois fritá-las, uma a uma, e nós a envolvê-las em açucar e canela. Ainda hoje, só gosto das filhoses da minha mãe.
Até aos oito anos acreditei no Pai Natal. oito ou...? Lembro como se fosse a noite passada. O adormecer. As nossas camas, lado a lado, as brincadeiras, os sussurros, a excitação, a ansiedade, as conversas do adormecer, cada vez mais espaçadas. Nessa noite, nunca me lembro que aparecesse 'o homem da janela' a espreitar, o meu 'monstro' particular.
E muitos dias antes, a carta. Enviada, posta no correio, aonde a minha mãe ia depois pedi-la de volta à chefe da estação. A carta dos desejos... Minha irmã era a escriturária, sempre com um rol de pedidos; eu, dois, três... e ainda tinha de pensar.
Nessa noite, na Noite de Natal, ajudávamos a pôr um paninho bonito, bordado, no poial da chaminé. E se a questão da estreiteza da entrada da chaminé por vezes se colocava, nunca era obstáculo para não se acreditar.
No dia seguinte, de manhã, mal despertava a aurora, a primeira a acordar chamava a outra, e íamos descalças - nem nos lembrávamos das pantufas- a correr para a cozinha. O frio nos pés, ainda hoje o sinto. E era o desembrulhar, as surpresas, o riso, as exclamações, e o brincar, brincar todo o dia. Um tão longo e bom dia.
Esses gestos, esse sentir foram as prendas maiores que ainda hoje recebo. Que ainda hoje ofereço.
Porque não é recordação, porque ainda, hoje, sempre, É.

A árvore de Natal ainda não a fiz. Questionei-me se a faria. Tantas vezes a fiz sózinha. Por mim, para mim. Por aquele Natal. Este ano, fá-la-ei, sim.
Não sei ainda quando, mas fá-la-ei. por mim.

domingo, 10 de dezembro de 2006

Entre o descascar batatas e cebolas, e a panela e o tacho ao lume, de faca de metal e madeira na mão, o pensar e o sentir corre sem prisões. por aqui. por ali. saboreando as mãos ocupadas. e entre isto tudo, seguro um pensamento. e sorrio. e penso Freud deve estar a rir-se. é mesmo, ri melhor quem ri por último.
Dou as mãos à palmatória, e rimos os dois...

A Casa da Lenha

A vida e a obra de Lopes Graça em cena no Teatro D. Maria I (Sala Garrett).
Daquele a que Eugénio de Andrade chamou 'anjo de pedra'. Um olhar de memória(s).
Memória pessoal, interiorizada; mas também memória colectiva de um país - porque a situação do país, desde a implantação da república até pós 25 de Abril, vai trespassando a sua/nossa vida. Daí que esta peça poderá ter uma componente pedagógica importante para as gerações que não vivenciaram nem conhecem as décadas 'cativas' do século XX. (se puderem levem os vossos filhos convosco a vê-la ).
E, claro, sempre a música, elemento fundamental nesta dramaturgia, desvendando a diversidade das obras do compositor, numa escolha criteriosa e límpida que fazem do texto, som e imagem um todo coeso e surpreendente.

Um apurado texto de António Torrado.
Uma óptima encenação de João Mota.
Uma sólida interpretação de Carlos Paulo.
Um excelente trabalho de toda a equipa.
Uma peça de qualidade, a ver sem dúvida.

Ainda uma das canções cantadas...

Oh pastor que choras
o teu rebanho onde está?
Deita as mágoas fora,
carneiros é o que mais há
uns de finos modos
outros vis por desprazer...
Mas carneiros todos
com carne de obedecer.
Quem te pôs na orelha
essas cerejas, pastor?
São de cor vermelha,
vai pintá-las de outra cor.
Vai pintar os frutos,
as amoras, os rosais...
Vai pintar de luto,
as papoilas dos trigais.

José Gomes Ferreira/F. Lopes Graça

sábado, 9 de dezembro de 2006




na praia, os homens afligem-se
pelo esbulho das vagas
às dunas fustigadas
as areias flutuam nas águas
temperadas

quinta-feira, 7 de dezembro de 2006

espírito natalício #3

do verdadeiro espírito natalício... um abraço... livre.

do espírito natalício #2

Adio… adio… ainda não fiz nem uma comprinha. A minha irmã já se encarregou de comprar, com a minha anuência, as prendas para os meus sobrinhos. Obrigada, mana. (Não queres também comprar para os restantes? já agora… e tu gostas de compras, eu detesto. nem para mim. sobretudo para mim.) No passado fim de semana fui a uma grande superfície – obrigações filiais – e fiquei vacinada. Oh que inferno!
Se nunca fez muito sentido, cada vez faz menos. Parte delas vão ser mesmo obrigações sociais. Outras… as familiares, são simultaneamente mais complicadas e mais simples. Se dissesse que não dava nada a ninguém, explicando porquê, não me levavam a mal, eu sei; mas no fundo ficavam sentidos… e já tenho uma certa ‘reputação’ de ‘marginal’… e além disso, não gosto de receber sem dar, mas gosto de dar algo escolhido, algo que seja mesmo para o outro. Ou que eu tenha feito. Vai ser complicado este ano. Não estou mesmo para aqui virada – para o Natal? -. Consumismo infernal! Uma mascarada… deixa-me lá ir comprar uma…

do espírito natalício #1

ou o inferno do trânsito nas semanas que antecedem o natal. No pára-arranca de horas para percorrer meia dúzia de quilómetros na capital, em vez do stress, aproveita-se para ver e pensar. Observar com um olhar semi-distanciado. Afinal, se olharmos de fora, também estou lá dentro. Munidos do subsídio de natal, ou do crédito, toda a minha gente resolve ir para a rua. Vai-se de carro, porque este mês até se tem dinheiro a mais. São as compras depois do trabalho, e lá vamos nós, já estafados de um dia inteiro, para as lojas, escolher a prenda (ou o presente, resolvam o que está na moda!) que gostaríamos de receber e afinal oferecemos ao outro; ou então damos mesmo o que dá mais jeito à carteira, pois até não é tão importante o que damos aos outros. O que importa é comprar e ficarmos em paz connosco próprios porque demos uma quinquilharia qualquer. E saímos das lojas todos ufanos e satisfeitos: "para aquele já está", e riscamo-lo do rol. E atravessamos as ruas cheios de sacos, saquinhos e saquetas, de preferência de marca – sim, porque o embrulho é fundamental – correndo para o outro passeio antes que um condutor impaciente por causa das bichas (sim, na minha época ainda não se dizia filas) nos atropele. E depois as luzinhas, as luzinhas que enfeitam árvores, prédios, as ruas… que bonito! E os cartazes, placards, outdoors, e afins, com tantas caras bonitas, desejáveis, com os produtos ali mesmo à mão … que tentação! Que dias felizes estes que antecedem o Natal!

terça-feira, 5 de dezembro de 2006

sinto os teus olhos
em mim levanto os meus
seguro o teu olhar
fixo um breve
e quase estremecer
de pálpebras
adivinho
na tua boca cerrada
o quase esboçar
de um sorriso
leve
o coração bate pausado
tumescido

domingo, 3 de dezembro de 2006

hoje quis dizer-te
vi uma espiga
ocre
mas não te encontrei

oito dias depois...












"o outro é um espelho sem o qual não nos vemos, não existimos (...) a única coisa que há para acreditar (...) [É] o único contacto que temos com o sagrado. (...) O amor é o que nos resta do sagrado"


M. Cesariny


Imagem retirada do IPM - Museu do Chiado

sábado, 2 de dezembro de 2006

apanho a areia
vem um sopro
espraia-se cristal

sexta-feira, 1 de dezembro de 2006

estendo o tapete feito de pétalas
cosidas com linhas
das mãos de seda
abro as janelas
de par em par
o campo entra
e com ele o azul lilás
de olhos
abertos
embrulho-me na manta de amoras
vendo o inverno cessar
fecha os olhos meu amor
fecha-os e dá-me a tua mão.
o caminho a percorrer
nunca o saberei, pela cegueira
das águas que em mim
moraram.
aonde estão os meus pés?