terça-feira, 12 de dezembro de 2006

do espírito natalício #4

Este ano ainda não vi o Natal. Não me reconheço neste Natal, das luzes foleiras, das árvores artificiais decoradas artificialmente, dos sorrisos forçados, das mentiras pró-conciliatórias.
Contudo, sei que o Natal está em mim. O meu Natal de criança. Fazíamos com a mãe, a árvore de Natal, com um pinheiro que íamos buscar à rua da frente, depois a areia e as bolas e as fitas... uma vez, fiz uma estrela para o topo da árvore. No fim, uns fios prateados para cobrir a areia, um papel de natal para esconder o balde. E o presépio, que foi crescendo, crescendo com múltiplas figurinhas. Eram todas importantes até o cordeirinho e a casa da montanha. O musgo que íamos apanhar, num domingo de manhã, ao olival. Agora, o presépio está em casa de minha irmã para os meus sobrinhos.
Na véspera, as filhoses começavam a ser feitas, havia força e tempo, força para as amassar, paciência para que levedassem durante horas, dentro de um cobertor, e depois fritá-las, uma a uma, e nós a envolvê-las em açucar e canela. Ainda hoje, só gosto das filhoses da minha mãe.
Até aos oito anos acreditei no Pai Natal. oito ou...? Lembro como se fosse a noite passada. O adormecer. As nossas camas, lado a lado, as brincadeiras, os sussurros, a excitação, a ansiedade, as conversas do adormecer, cada vez mais espaçadas. Nessa noite, nunca me lembro que aparecesse 'o homem da janela' a espreitar, o meu 'monstro' particular.
E muitos dias antes, a carta. Enviada, posta no correio, aonde a minha mãe ia depois pedi-la de volta à chefe da estação. A carta dos desejos... Minha irmã era a escriturária, sempre com um rol de pedidos; eu, dois, três... e ainda tinha de pensar.
Nessa noite, na Noite de Natal, ajudávamos a pôr um paninho bonito, bordado, no poial da chaminé. E se a questão da estreiteza da entrada da chaminé por vezes se colocava, nunca era obstáculo para não se acreditar.
No dia seguinte, de manhã, mal despertava a aurora, a primeira a acordar chamava a outra, e íamos descalças - nem nos lembrávamos das pantufas- a correr para a cozinha. O frio nos pés, ainda hoje o sinto. E era o desembrulhar, as surpresas, o riso, as exclamações, e o brincar, brincar todo o dia. Um tão longo e bom dia.
Esses gestos, esse sentir foram as prendas maiores que ainda hoje recebo. Que ainda hoje ofereço.
Porque não é recordação, porque ainda, hoje, sempre, É.

A árvore de Natal ainda não a fiz. Questionei-me se a faria. Tantas vezes a fiz sózinha. Por mim, para mim. Por aquele Natal. Este ano, fá-la-ei, sim.
Não sei ainda quando, mas fá-la-ei. por mim.

Nenhum comentário: