quinta-feira, 31 de agosto de 2006

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Os mistérios não são segredos; é apenas o que ainda não se conhece, o que ainda não se desvendou, descobriu. Desvendar não devassar; devassar é lançar-se qual elefante numa loja de porcelanas, tentando eliminar enigmas, sem os compreender.

Gosto mistérios. De os sentir, de os provocar.

Gosto do sabor, de experimentar a sua descoberta. Olhando pouco a pouco o que não sei, o que não compreendendo. Como um puzzle. Peça a peça. Vendo a imagem que se forma, surpreendendo-me. Gosto de ir reconhecendo, aqui e ali, pedaços já vividos (é por isso – ou é também por isso - que os amigos são para nós especiais – porque ao mesmo tempo que nos surpreendem, são reconhecíveis, identificáveis por nós:

- “Só podias ser tu a fazer/dizer isso”, pensamos)

Com o amado acontece a mesma coisa. Que bom é ir descobrindo. Pouco a pouco. Porque se se devassar, não se chega a conhecê-lo. Há retraimento. Há fuga. Há fechamento. Mesmo que na descoberta do outro, possa haver compreensão pela devassa, ou pela ânsia da devassa, há inevitavelmente uma tristeza associada. A revelação de algo negativo numa relação amorosa.

Nesta, é imperioso pezinhos de lã (ou usando uma analogia tipicamente masculina. A história do volante do automóvel). Não que se deixe de ser autêntico, sincero, espontâneo. Mas porque a nossa liberdade acaba quando começa a do outro. É um jogo. Sério, mas um jogo. Um equilíbrio entre as capacidades e limitações de um e as do outro. Por isso há tantas relações desequilibradas.

Mistério não é segredo. É acreditar sem se saber exactamente em quê. Sem conhecer o justo contorno. É espelhar num outro o nosso próprio mistério, e descobrindo os pontos em que eles se tocam, os pontos em que separam.

O mistério abre todas as portas, hipoteticamente. E é o que provoca eventualmente o medo. O medo de si próprio.

Devassar é aniquilar, matar. O mistério é… essência de nós.

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