quinta-feira, 26 de agosto de 2004

paisagem alentejana pós-moderna


dos chaparros, dos sobreiros, da planície esverdeada que se ia tornando quase queimada pelos raios solares, das longas horas que incluiam piquenique à beira barragem da sra. da rocha - com canções e pastéis de bacalhau à mistura - que bons sabores! - e, quase no fim da viagem, as florzinhas das mimosas, ou as laranjeiras de Silves carregadinhas, resta a memória. Porque o tempo urge, engrenamos na 5ª velocidade, enquanto esperamos pela 6ª. Apenas uma paragem. Sim, já não é Alentejo, mas ainda não é o Algarve. Este é apenas quando se vê o azul das águas. Entre uma casa e a outra casa, o alcatrão. A paisagem informada pela urgência. Quebrada pelos gestos lentos dentro de um habitáculo rolante, de cumplicidades. De suavidade. De carinho. Ou pelas conversas sem tempos ao sabor das ideias...
Amanhã será assim.
Finalmente, férias!

domingo, 22 de agosto de 2004

nós


Estávamos juntos, no segredo de pétalas vermelhas, na solidez do espaço interdito.
Ao fundo, uma aguarela de raios solares.
Estas são as folhas onde nos escrevemos.

quinta-feira, 19 de agosto de 2004

peças de vida

"
Todo-o-mundo
Eu hei nome Todo-o-Mundo
e meu tempo todo inteiro
sempre é buscar dinheiro,
e sempre nisto me fundo

Ninguém
Eu hei nome Ninguém
e busco a consciência

Berzebu
Esta é boa experiência:
Dinato, escreve isto bem.

Dinato
Que escreverei, companheiro?

Berzebu
Que Ninguém busca consciência
e Todo-o-Mundo dinheiro"

Gil Vicente - Auto da Lusitânia





Há cerca de 60 anos, um homem e um mulher conheceram-se. Representaram esta peça, em teatro amador. Desde que me dou como gente lembro-me desta história, deste trecho, repetida porque ainda, e sempre actual, repetida porque tem a ver com momentos únicos, de amantes.
Ontem encontrei exactamente este excerto, impresso, no meio de milhares de papéis antigos, que investigava, no trabalho. Ontem, tive mais uma vez a comprovação de que realmente neste Mundo é necessário ter algum dinheiro para sobreviver, ou para viver com alguma dignidade. Não admira que todos o procurem, mas justifica que toda a vida, nele se funde?

terça-feira, 17 de agosto de 2004

procurando o invisível...


"Porque sou do tamanho do que vejo
E não do tamanho da minha altura..."


Alberto Caeiro

segunda-feira, 16 de agosto de 2004

Noite vermelha

I

agarro teus beijos
transmuto-me ternura

II

surpreendes-me na ternura
- e eu com medo
do amor – palavra doida – sinto-o
calo-o na voz viva
suspendo-o em gestos largos
dados
grito de mansinho
és tu
sol ou homem
eu, sombra de lua

III

Noite quente
azul
troncos ou braços
seiva
no cerne
em botão flor
vermelha

sexta-feira, 13 de agosto de 2004

aparências e outras miudezas...

Parece que estive de férias. mas as únicas férias que até agora tirei - sim, um fim de semanita mais prolongado não são propriamente férias - foram as blogoférias. Durante este tempo... ena! quase 10 dias, foram tantos dias!... neste período, pensei fazer uma pausa. uma verdadeira pausa blogosférica. talvez crise de inspiração (afinal já são mais de sete meses, aqui), talvez a necessidade de escrever esteja a ser - e bem, se pensar racionalmente - canalizada para outras escritas, talvez a necessidade de comunicar com o mundo esteja também mais mitigada por variadas razões.
Mas o que é certo é que gosto de escrever, gosto muito, e se aqui o descobri de um modo mais intenso, continuarei a fazê-lo, quem sabe, aqui, ou sem visibilidade num qualquer caderninho... num log sem web... Gosto deste formato, de textos e imagens, gosto deste semi-anonimato, gosto dos vossos comentários, da partilha que isso implica. É estranho, mas este lugar é mesmo um pouquito de mim, porque tem a ver comigo, reconheço-me nele.
Às vezes, com o cansaço acumulado de quem não tirou ainda férias, e que verdadeiramente não vai tirar no sentido amplo da palavra, estende-se a este lugar. Como sempre nunca saberei se vou publicar amanhã e muito menos o que escreverei... mas estou aqui, agora, quebrando um bloqueiozinho... e ... depois? aqui é o reino das efémeras incertezas. lá fora, cá fora, projectos para acabar, outros que se iniciaram, outros ainda espero nunca os acabar, de inesgotáveis que gostaria que fossem. A vida que enfim se delinea em sucessivos passos... letra a letra... visível ou invisível...

quarta-feira, 4 de agosto de 2004

Sexto quê?

Por vezes sinto este instinto canino. É mais forte do que eu. Se farejo qualquer coisa, tenho de seguir o rasto... até encontrar. (Ou pelo menos, julgo que encontro.)

segunda-feira, 2 de agosto de 2004

Caminhos

Há passos que se dão com plena consciência, com toda aquela consciência que é possível ter em determinado momento. Outros, parece que são levados, guiados pelo vento. Como se não fossemos nós que os déssemos. Contudo, somos. Demo-los. Sem pensar muito, sentimos apenas os passos. Sem ainda se Ser muito. Sem se ser o bastante. É o caminho invisível. Aquele que já deixámos de ver. Que nunca vimos realmente. Apenas quando se pára. Como num cruzamento. E se olha para trás. Esse, o caminho inacessível. Todos os outros, os possíveis. A paragem não é dúvida. É reflexão. É olhar, finalmente. Para adiante. Para todos os sentidos do ‘adiante’. Parar, sentindo pela primeira vez, que se caminha. Depois… depois, cada passo torna-se uma passada mais firme, mais ciente, mais consciente. E o horizonte não se limita apenas aquele ponto minúsculo ao fim de um caminho. O horizonte … é tudo aquilo que quisermos.