terça-feira, 30 de dezembro de 2003

antevéspera rolante

Chiado, o corre-corre das compras, o oferecer sem dar, sem se dar, para cima, para baixo, ou esquerda e meia-volta, às voltas, sem destino ou sem tino, de rostos fechados, nem um sorriso, passam e olham apenas vidros, montras do nada, repletas de vazios de brilhantes. Numa mesa de café, com um presente comprado, porque pedido por outrem, e um outro, feito por mim que não sei se entregarei esta noite. Apetece ficar aqui na distanciada proximidade do rebuliço do inútil que contrasta com a quietude silenciosa de uma casa cheia do alvoroço que já não se contém entre as quatro paredes.
Só os predadores miram sem olharem, de resto ou tudo, a indiferença de uma massa corredora, atropeladora. Soa música de natal. Onde está ele? A diferença entre hoje, antevéspera do dito, e um dia qualquer, apenas a quantidade de sacos que transportam nas mãos. Conteúdos efémeros logo esquecidos não acarinhados não sentidos. Um sorriso mulato, feminino, ao telemóvel, resquício de uma alegria infantil perdida no meio das luzes. Levanto-me, pego no saco, desço as escadas rolantes, e rolo, e rolamos multidão.

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